sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sonho

"O sonho encheu a noite
Extravasou pro meu dia
Encheu minha vida
E é dele que eu vou viver
Porque sonho não morre."
Adélia Prado

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Como resistir?

"todos caminhos trilham pra a gente se ver
todas as trilhas caminham pra gente se achar, viu? (...)
você passa, eu paro
você faz, eu falo
mas a gente no quarto sente o gosto bom que o oposto tem
não sei, mas sinto, uma força que embala tudo
falo por ouvir o mundo, tudo diferente de um jeito bate..."

E naquele dia, naquela noite, estava ele ali parado com seu sorriso fitando a minha alma, despindo os meus desejos. Não me importava mais o que acontecia à minha volta. Aquele instante era meu. Aquela vontade era nossa. Delicadamente coloria cada pedaço do meu corpo. Tocando-me sem as mãos, falando comigo em silêncio, despindo-me com os olhos, devorando-me em pensamento. E eu, entregue. Com uma certeza: era dele.
Aquele homem me cativava, me trazia à tona toda vez que meus dilemas existenciais me colocavam em baixa. Era ele. E o melhor: ele não sabia disso.
Ele dormia comigo, acordava comigo. Desde sempre, desde o início. Era fantasioso e ao mesmo tempo excitante. Deitávamos e meticulosamente nosso corpo se encaixava. Como resistir?
Eu existia para ele e não precisava de post-its para lembrá-lo. Era torturante saber que eu estava tão presente nele. Nunca fora assim. Eu sempre me deixava perdida, esquecida num canto qualquer devorando as sobras de um relacionamento qualquer. Mas com ele era diferente. Era inédito.
Fitava seu rosto tentando decifrar o que não tinha resposta. Tentava colocar em palavras o que estava perfeito nas entrelinhas. E assim me acostumei com sua presença apenas à distância de uma respiração. Só sabia respirar o mesmo ar de um espaço encaixado entre nós dois.
Era doce dormir nos seus braços e saber que estava me acorrentando a perspectivas. Pensei muitas vezes em fugir, mas quando olhava seu sorriso, que teimosamente surgia depois de uma palavra ou gesto meu, desistia de qualquer plano de dominação mundial. Entregava o meu mundo sem alardes, sem diplomacia ou ordem de despejo. Simplesmente desistia de desistir.
Mesmo percebendo todo o meu embaraço desastrado de tentativas frustradas, ele fingia não entender e me dizia ao pé de ouvido: “vem cá, chega mais perto, me abraça”. Como resistir?
E no instante entre o som e o silêncio residem os sonhos e uma infinidade de palpitações. Residimos eu, ele e seus sorrisos. A certeza é só uma: isso tudo pode ser um sonho, mas desse sonho acordo toda manhã. Com um bom dia, um abraço e um cheiro no pescoço. Como resistir?

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Sobre sentimentos

Apesar dos sorrisos marcarem-lhe o rosto, fracassos e lágrimas marcavam-lhe a alma. Mesmo assim continuava sua caminhada porque o importante era sentir, era ter aquele sentimento latejando, pulsando. 
Emoções à flor da pele, toques que fazem estremecer, respiração ofegante. Isso a fazia sentir. Isso a fazia sonhar. Não era boa com realidades profundas, apenas com sonhos indiscutivelmente supérfluos: um sorriso, uma valsa, aqueles versos de encher qualquer olhar de admiração. Inocente criança num corpo de mulher. 
Assim era seu mundo colorido, na inocência e necessidade de sentimentos urgentes. E se entregava com tenacidade. E se entregava com veracidade. Acreditava que, além do sentimento, aqueles corpos eram sólidos nas suas vontades, desejos, libido. 
Aquilo era um romance, um enredo; amor eterno com intimidade. Todo amor é eterno, por que aquele não seria? 
E quando ficou longe? Ficou travada na garganta a palavra "saudade". Orgulho? Medo? Uma interrogação, nenhuma resposta. Talvez um escudo, um caminhar, uma tentativa de seguir em frente sem lamentações. 
Boas lembranças, somente boas, guardadas na memória e no coração que pesava de saudade. Saudade da pele, do cheiro, da palavra, do gosto. Fatos além da química, da física e até mesmo da língua portuguesa. Como expressá-los em palavras? Tarefa impossível. Saudade. 
E quando tudo voltou ao normal, após o que pareceram séculos de colo, lágrimas e sensações ruins; o suspiro de alívio e o abraço de reencontro. É o que fica. Nesta ciranda poética de lembranças e esquecimentos só resta dizer: viver. Pulsar. Murmurar. Apaixonar. Desistir. Voltar atrás. Tocar. Amar. Entregar. Verbos que dariam uma boa prosa.

Vida muda

Silêncio total
E ausência profunda

O grito
É mais que um pedido
De ajuda

É súplica
E, assim, eu repito:

Vida, muda!

Sobre escrever

Escrever muitas vezes, talvez na maioria delas, não é arte, somente prazer. Escrever por prazer talvez seja também uma arte, porém a ação de fazê-lo nada mais é do que se interessar pelo que gosta e transformar um dom em hobby.
Para mim é assim: transformar pensamentos em palavras e vice-e-versa, jogando-os no papel para fazer com que signifiquem alguma coisa.
E o que é "significar"? Algo que se torne explicável? Traduzível? Passível de ser entendido? Quem escreve por prazer tem mais uma característica: suas palavras só fazem sentido para uma pessoa, ela mesma. Isso não significa falar em códigos para que ninguém a leia ou entenda, nem se esforçar para que suas palavras sejam as mais confusas possíveis, trata-se somente de escrever com um órgão, apesar de o cérebro comandar o ato e a mão direita torná-lo realidade: com o coração.
Quem tem o dom das palavras não quer que a leiam, palpitem, se interessem ou deixem de se interessar. Quem escreve apenas o faz, sem maiores pretensões. E, mesmo que tente fugir de fazê-lo, não adianta, um dia o dedinho coça e... olha lá ela de novo com caderno e caneta na mão!